2007-11-12

José Murilo de Carvalho - Os Bestializados

Hoje estou postando para vcs o meu resumo do primeiro capítulo do livro "Os Bestializados" do professo José Murilo de Carvalho.

Cap 1: O Rio de Janeiro e a República
(Discute as transformações ocorridas nos primeiros anos republicanos na capital e suas conseqüências)

Na 1a década republicana, o Rio de Janeiro passou por transformações de natureza econômica, social, política e cultural. Demograficamente, i) a população aumentou e se diversificou em termos étnicos e de ocupação com a abolição (que jogou grande mão de obra no mercado e engrossou as fileiras do subemprego), o êxodo rural e à imigração; ii) houve um desequilíbrio entre os sexos (homens sendo 56%) e baixo índice de nupcialidade (26%); iii) aumento do subemprego ou da desocupação (e esse grupo poderia se juntar às “classes perigosas”). Esse aumento populacional refletiu-se nas condições de vida: i) carência de habitação; ii) os problemas de abastecimento de água, de saneamento e de higiene se agravaram; iii) epidemias, como as de varíola e febre amarela, em 1891, que se juntava às tradicionais malária e tuberculose.
Economica e financeiramente, para aplacar os cafeicultores e para atender a demanda por moeda corrente, o governo começou a emitir dinheiro. Houve uma febre especulativa – que ficou depois conhecida como Encilhamento – e milionários faziam-se e desfaziam-se. Devido ao consumo conspícuo dos novos ricos, os importados subiram de preço e os preços dobraram em 1892. O moeda desvalorizou-se e o governo aumentou o imposto sobre os importados, encarecendo-os ainda mais. O aumento dos salários de longe não acompanhou a inflação. Com a imigração, ampliava-se a mão de obra a disputar os escassos empregos.
Politicamente, a república trouxera grandes promessas de maior participação política. Houve um sem número de manifestações. Os militares haviam provado, no início da república, do poder que desde a regência lhes havia fugido das mãos e julgavam-se os salvadores da pátria a qualquer momento se achando no direito de intervir. Os operários acreditaram nas promessas do novo regime e tentaram organizar-se em partidos e promoveram greves. Os capoeiras – até por antes fazerem parte da Guarda Negra – foram talvez o único setor a ter sua atuação comprimida. Os anarquistas estrangeiros foram deportados.
Quanto às idéias, houve um “abrir de janelas”, um “porre ideológico”. “Misturavam-se, sem muita preocupação lógica ou substantiva, várias vertentes do pensamento europeu.” Houve uma atitude nova e mais participativa dos intelectuais em relação à política. No nível das mentalidades, houve uma “sensação geral de libertação”, uma mudança nos padrões de moral e honestidade (sendo fruto desse último o desejo de enriquecimento rápido ilustrado pelo encilhamento, a “vitória do espírito do capitalismo desacompanhado da ética protestante”. Os costumes também se tornaram mais soltos: “o que antes era semiclandestido [...] adquiriu com a República [...] foros de legitimidade pública.” Se o operariado esperançava mais participação política com a República e, pois, a via com bons olhos, o proletariado viu a monarquia cair em seu auge de popularidade – com a abolição. “A prevenção republicana contra pobres e negros manifestou-se na perseguição contra os capoeiras, na luta contra os bicheiros e na destruição do Cabeça de Porco.”
Quais seriam, então, as conseqüências dessas transformações? O problemas central era conseguir um outro pacto de poder que conseguisse estabilidade. Durante quase 10 anos da república, as agitações se sucediam na capital, havia guerra civil no sul, havia risco de fragmentação, a crise do café ameaçava a economia e a dívida externa galopava. Para os exportadores e para a unidade política, a instabilidade preocupava. Era necessário reduzir a participação da capital, o que se traduzir em duas coisas: tirar os militares do governo e reduzir o nível de participação popular. O militares estavam muito concentrados no Rio de Janeiro e participavam constantemente nas agitações políticas. Para neutralizar a capital e as forças que nela jaziam, seria necessário fortalecer os estados.
Essa foi a obra de Campos Salles, bypassando o congresso com a sua “política dos estados”, a capital e suas confusões. A dissolução da Câmara de Vereadores (durante o governo provisório), o Código de Posturas (de 1890), a nomeação de prefeitos e chefes de política e o autoritarismo ilustrado (presente nas medidas do engenheiro Pereira Passos e do médico-sanitarista Oswado Cruz) são índices de uma “cidade deliberante” indesejada. Dissociava-se o governo municipal da representação dos cidadãos. Havia um grande mundo de participação popular, mas que passava ao largo da política (com as festas populares, as comunidades éticas, mais tarde as associações operárias, a Pequena África da Saúde, o cabeça de porco, e etc.). Foi criado pela república um novo Rio, domesticado, que entrou na belle époque. As finanças foram sanadas por Campos Salles. Sobraram recursos para as reformas urbanas; as antenas estéticas voltadas para a Europa. Houve um apartamento social ainda maior. Mas se esse novo Rio aumentava a segmentação social, as repúblicas do Rio continuavam a viver, a renovar-se a forjar novas realidade sociais e culturais. Elas poderiam manifestar-se politicamente de modo violento.

2 comments:

Haku said...

Há um livro lançado recentemente que é um pouco uma resposta a esse fato que a proclamação foi assintida pelo povo bestializado:
http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=1173
Não li esse livro. Só li o do José Murilo, que é muito bom. Mas sempre é bom ler outras versões.

Unknown said...

Adorei o Resumo do 1 capitulo, muito bem estruturado.

Obs: Você acabou de salvar a minha vida com esse resumo, muito obrigadoo mesmoo...