2008-05-03

Casa Grande e Senzala

Estou relendo Casa Grande e Senzala. O texto sempre esteve na bibliografia básica do concurso e é um texto básico de sociologia brasileira. Digo “relendo”, pois li alguns trechos em "Cultura Brasileira", na faculdade. (Aliás, aproveito para homenagear o jovem professor Daniel que leciona na cadeira na PUC do Rio de Janeiro. Por incrível que pareça, prefiro as aulas quando são totalmente baseadas nos autores. Dessa maneira o aluno pode sempre utilizar uma idéia com a qual teve contato durante a aula citando a própria fonte, e não somente um professor. Daniel colocou como proposta transmitir um pouco de cultura brasileira através de seus sociólogos clássicos: Paulo Prado, Euclides da Cunha, Sérgio Buarque de Hollanda e Gilberto Freyre. Foi durante o espaço dedicado a Gilberto Freyre que li alguns capítulos de Casa Grande.)

Uma frase relativa a Freyre ficou impressa na minha cabeça e, inconscientemente, me resumia a obra: “Gilberto Freyre mudou o sinal da miscigenação.” Com isso, quis ele dizer que GF deixou de considerar a miscigenação um aspecto negativo do homem brasileiro.

Contudo, tal qual seus antecessores mais longínquos – aos quais refuta – GF continua trabalhando com a premissa de que o homem brasileiro tem deficiências e, senão, possui certos traços que nos levariam a concluir que é inferior a outros povos. A diferença do pensamento de GF não está aí, está no motivo que gera essa inferioridade.

GF não deixa de relacionar como fatores influentes o clima e a temperatura, mas os ressalva. Coloca que o homem português – devido à miscibilidade absorvida pelo contato com os Mouros durante a invasão da península ibérica, e pela passado de diferentes possessões em diferentes partes do mundo, etc – estaria mais adaptado que outras “raças” européias à vida nos trópicos. Ressalta que a adaptabilidade e não a simples transposição de um sistema de valores europeus para a Europa fizeram que o império português nas Américas – desprovido de mulheres brancas, por exemplo – pudesse ser viável. Mas além do clima, dentre outros, GF inclui no rol de motivações a paupérrima alimentação do brasileiro, pobre em carnes, legumes e frutos frescos – devido ao latifúndio e à monocultura que a tudo absorvia.

Na introdução da edição que creio ter sido a última – (47a) belíssima, de 2003, a qual comprei usada através do Estante Virtual – Fernando Henrique Cardoso aponta algumas contradições do texto, entre as quais o fato de que o próprio Gilberto Freyre que desde o início da obra aponta o problema de se igualizar raça e cultura, peca por fazer exatamente isso em diversos trechos afirmando, por exemplo, que a miscibilidade do português provém do mouro.

Ao mesmo tempo, descontando essas impropriedades – lendo-se o texto com esse discernimento –, é possível identificar alguns aspectos relativos ao que já se chamou de “História das Mentalidades”. Qual seria o substrato mental que ensejou o tipo brasileiro (se é que isso existe)? É isso que creio devemos buscar em GF.

No comments: